Como calcular Chuva Efetiva pelo Método SCS?

Introdução

Em uma bacia hidrográfica, uma das informações mais relevantes para a estimativa de parâmetros hidrológicos e hidráulicos é a precipitação. Uma parcela da chuva se converte em escoamento superficial e se incorpora no corpo d’água da bacia. Um método utilizado para determinar esse tipo de ocorrência é a Chuva Efetiva – SCS.

A Chuva Efetiva – SCS apresenta várias nomenclaturas como: método de Curve Number; Método SCS; Método CN; Método de Chuva Excedente. Esse método representa a precipitação total e a parcela de chuva convertida em escoamento, a partir de algum método de distribuição de chuva em função. Existem alguns métodos na literatura desenvolvidos para estabelecer a distribuição de chuva, como:

Os dados gerados pelo método de destruição de chuva são utilizados como dados de entrada para o Método de Chuva Efetiva – SCS. Entretanto, a título de entendimento global a respeito do método, deve-se atentar para o fluxo lógico da origem até a construção final do gráfico de Chuva Efetiva. O início do processo ocorre na curva IDF que gera o Hietograma, no qual vai ser usado para construir a Distribuição de chuva e, por fim, o gráfico da Chuva Efetiva – SCS (Figura 1).

Figura 1 – Processo lógico até a construção do gráfico de Chuva Efetiva.

A curva IDF e o Hietograma apresentam o volume de chuva frequente em uma determinada região ou cidade, mas não a distribuição da chuva em relação ao evento real da chuva. Em uma chuva que ocorre no meio ambiente, inicialmente há menores incidências de precipitação e progressivamente acontece um aumento dos valores. Depois, a precipitação reduz até o término da chuva, como mostram os gráficos de Hidrograma e Chuva Efetiva (Figura 1). A diferença entre esses dois gráficos é que no último, mostra os valores da precipitação total e da precipitação excedente (escoamento).

Mesmo se o leitor não tiver conhecimento de todos os métodos  de distribuição que antecedem o método de Chuva Efetiva, será possível a compreensão do presente artigo. As etapas de cálculo que serão voltadas, exclusivamente, para se obter a Chuva Efetiva.

Desse modo, o presente artigo apresentará as etapas para obter a Chuva Efetiva pelo método SCS. Anteriormente, as bases teóricas serão detalhadas para o entendimento completo e, finalmente, construído o gráfico de Chuva Efetiva, por meio de um exemplo prático.  

Contextualização do método

O Soil Conservation Service (SCS) criou o método em 1950. Foi de desenvolvimento empírico, baseado em análises de chuva e vazão de diversas bacias. É amplamente utilizado no Brasil e em outros países. Caracterizado como sendo de simples aplicação e completo, pois considera muitas variáveis que outros métodos não usam.

Quais as finalidades da Chuva Efetiva?

A Chuva Efetiva representa mais semelhantemente a precipitação real e informa o quanto da chuva total foi excedente, após o solo atingir a saturação hídrica. Isso significa dizer a parte da chuva que não infiltrou, nem evaporou, nem foi retida pela cobertura vegetal, mas escoou até chegar na bacia hidrográfica.

Além disso, uma outra finalidade é com relação aos valores excedentes da Chuva Efetiva (Y). Os valores excedentes (Y) são aplicados nos cálculos para a construção do Hidrograma de Projeto, como mostra a Figura 2. Observa-se então que a partir da Chuva Efetiva se pode fazer a relação entre a chuva precipitada e a vazão na bacia.

Figura 2 – Valores excedentes Y aplicados na obtenção do Hidrograma de Projeto.

Relação Chuva-vazão

A precipitação total (P) pode ser representada pela seguinte Equação (1):

Se P = Q (reta q), isso significaia que todo o aporto da água da chuva seria convertido em vazão da bacia hidrográfica, com uma relação linear (Figura 3).  Porém, isso não ocorre na natureza. Na verdade, a reta q funciona como parâmetro de comparação para a situação da “reta r”.  

Figura 3 – Relação Precipitação – Vazão.

A relação mais próxima do evento real na natureza, ocorre por meio de uma equação formada por diversos dados de relação chuva-vazão, como na “reta r”. Observa-se que ao atingir a capacidade máxima de infiltração (em S), a taxa de infiltração passa a ser constante e a água passa a escoar na superfície.

Etapas do método

As etapas da construção do método consideram três categorias, como mostra a (Figura 4).

Figura 4 – Categorias para a obtenção da Chuva Efetiva – SCS.

A primeira etapa está relacionada ao Uso e Ocupação, sendo utilizado o Curve Number (CN). Se a área for coberta por asfalto, o CN será alto. Se o local for uma floresta, o CN apresentará um valor baixo. Mas, o método depende também do Grupo do Solo. Caso, a região seja composta majoritariamente por areia, haverá sempre uma importante infiltração, influenciando diretamente na vazão bacia.  Além disso, a Umidade do solo que leva em consideração a umidade antecedente do local. Se em uma bacia, houver uma chuva alguns dias antes, o solo já se encontrará úmido, isso irá influenciar na infiltração e no escoamento da água.

Curve Number

Quanto maior o valor de CN, maior a capacidade de escoamento e menor infiltração o solo ou a cobertura local irá apresentar. Quanto menor o valor de CN, menor capacidade de escoamento e maior infiltração. O gráfico do CN (que relaciona chuva e vazão) pode ser observado na Figura 5.

Figura 5 – Perfil de velocidades dos pontos de medição e área de influência. Fonte: USDA (1986).

Para o mesmo CN 50 (Figura 6), podemos observar que para a precipitação P = 5, a vazão será por volta de Q = 0,8; para P = 7, teremos Q = 1,8 e; para P = 9 e Q = 2,9. Então, para o mesmo valor de CN, a vazão foi elevada conforme o aumento da precipitação.

Figura 6 – Vazões de CN 50. Fonte: USDA (1986).

Se for fixada a vazão Q = 5 (Figura 7), podemos notar que no CN 50, a vazão será cerca de Q = 0,8; CN 70, teremos Q = 2 e; CN 90, aproximadamente de Q = 3,9. Dessa vez, os valores de Q foram aumentados pela influenciada da elevação dos valores de CN.

Figura 7 – Vazões de Precipitação P = 5. Fonte: USDA (1986).

Grupos de Solos

Os grupos de solos são formados por A, B, C e D. O Quadro 1 mostra as descrições das classificações hidrológicas dos solos. As principais características do Grupo A são solos arenosos de até 1,5 m de profundidade, com baixo teor de argila total inferior a 8%. O Grupo B de solos arenosos com profundidade menor que 1,5 m, argila total inferior a 15%.  O Grupo C são solos barrentes com profundidade de 1,2 m, 20 a 30 % de teor de argila. O Grupo D de solos argilosos com 30 a 40% de argila total e com camada densificada de 50 cm.

Quadro 1 – Classificação Hidrológica do Solo.

Fonte: Rolim (2004).

Para o estudo de um projeto, a curva granulométrica de um solo pode ser semelhante a apresentada na Figura 8. Essa curva foi definida conforma a norma ABNT NM 248/2003.

Figura 8 – Curva Granulométrica de um projeto. Fonte: ABNT NM 248 (2003).

A ABNT NM 248/2003 foi substituída pela ABNT NBR 17054/2022 – Agregados – Determinação da composição granulométrica – Método de ensaio. Em carácter de aplicação teórico, a curva da ABNT NM 248/2003 foi utilizada para explicar a sua interpretação e aplicação do método proposto.

A Curva Granulométrica pode ser entendida da seguinte maneira. Pelo gráfico (Figura 9), o limite inferior para areia grossa é 3%, para areia média 6%, para areia fina 11%, para silte 58% e argila 97%. Esses valores não representam a composição do solo. O percentual de cada parcela é obtido pela diferença entre o seu limite superior menos o limite inferior.

A composição da areia grossa é dada pela subtração do percentual pelo limite superior da areia grossa de 6% menos 3% do pedregulho (limite inferior), ou seja, são 3% de areia grossa. O mesmo raciocínio se aplica para as demais categorias, sendo, portanto, a composição de 5% de areia média, 47% de areia fina, 39 % de silte e 3% de argila. Desse modo, esse solo é uma areia siltosa.   

Figura 9 – Composição do solo. Fonte: ABNT NM 248 (2003).

Umidade do solo

A umidade do solo é composta por três categoria de solo (I, II e III). Destaca-se que essa umidade considera eventos antecedentes (Quadro 2). Por exemplo, se houver uma chuva 5 dias atrás, quando chover novamente, o solo já apresentará uma umidade referente a chuva ocorrida anteriormente. Assim, a capacidade de infiltração desse solo será menor. Na condição I, o solo estará seco (com chuvas de <15 mm nos últimos 5 dias). Na condição II, situação média (de 15 a 40 mm em 5 dias). Na condição III, solo úmido (>40 mm em 5 dias).

Quadro 2 – Condição do solo em relação a umidade antecedente.

Fonte: Rolim (2004).

Para a utilização do Quadro 2 de Umidade do Solo antecedente, é necessário conhecer as precipitações em um período de 5 dias. Um banco de dados históricos de precipitação deve ser analisado como na Figura 10. Em dezembro de 1940 dos dias 2 a 7/12, o somatório de precipitação foi de 20,6 mm. Em março de 1941 dos dias 2 a 7/03, a soma foi de 47,7 mm. Esses dados foram coletados de uma estação pluviométrica pelo site do DAEE: http://www.hidrologia.daee.sp.gov.br/.  

Figura 10 – Dados de precipitação e valores de precipitação em 5 dias seguidos. Fonte: DAEE (2010).

Área composta por diferentes CN

Caso uma área seja compreendida por diferentes configurações de cobertura (Figura 11) e distintos valores de CN, é possível calcular um CN ponderado.  

Figura 11 – Área com diferentes coberturas.

O cálculo de um CN ponderado pode ser dado pela Equação 2:

A Tabela 1 mostra os valores de CN em relação a cobertura do solo e tipo de solo, para a condição de umidade II. Por meio da tabela abaixo, é possível realizar o cálculo do CN ponderado.

Tabela 1 – Valores de CN em função da cobertura do solo e do tipo hidrológico de solo, para a condição de umidade II.

Fonte: ROLIM (2004).

Conversão de CN

Para a realização de conversão de CN, caso a condição de umidade do solo seja mudada, a Tabela 2 apresenta os valores para os devidos ajustes.

Tabela 2 – Conversão de CN de acordo com o tipo de umidade.

Fonte: ROLIM (2004).

Etapas das aplicações das equações do método

Inicialmente, calcula-se a infiltração máxima S dada pela Equação 3:

O valor das Perdas Iniciais Ia é 20% de S. Portanto, as Perdas Iniciais são dadas pela Equação 4:

Depois se calcula a precipitação efetiva pela Equação 5:

As verificações iniciais, para saber se haverá a precipitação efetiva, são dadas por:

Exemplo Prático

Após todas as exposições teóricas é possível proceder com os cálculos da Chuva Efetiva – SCS. Primeiramente, determinou-se o valor de CN (como foi exposto nas etapas inicias), depois se calculou a Infiltração potencial máxima (S) e Infiltração inicial (Ia). No exemplo, os valores encontrados foram CN = 80 (Tabela 1), S = 63,5 mm (Equação 3) e Ia = 12,7 mm (Equação 4).

Foi construída uma tabela de cálculo (Tabela 3), sendo que os dados de entrada (tempo e precipitação total) foram referentes ao Método de Distribuição de Chuva SCS.

Tabela 3 – Dados de entrada do exemplo prático.

A Precipitação Acumulada (P. Acum.) foi calculada como sendo a soma da Precipitação Total (passo atual) e P. Acum. (passo anterior), como mostra a Figura 12. Na primeira linha, a soma foi zero e cinco, pois não havia nenhum valor anterior de precipitação acumulada.

Figura 12 – Cálculos de Precipitação acumulada.

A Precipitação Excedente Acumulada (P. exc. Acum) foi calculada de acorda com a Equação 5 e suas verificações de existência, como mostra Figura 13. Na primeira linha, a verificação P – 0,2 x S foi inferior a zero. Por isso, Pe foi considerada igual a zero. Nas demais linhas, todas as Pe foram calculadas, pois as verificações foram obedecidas, com P – 0,2xS > 0 e Precipitação Acumulada P > 0,2xS (ou seja P>12,7).

Figura 13 – Cálculos de Precipitação Acumulada Excedente.

Foram calculadas a Perdas (mm), dadas pela diferença da Chuva Acumulada (P. Acum.) e Chuva Excedente Acumulada (P. exc. Acum.), como mostra Figura 14.

Figura 14 – Cálculos de Perdas.

Os valores da coluna do Hietograma excedente (mm) foram obtidos pela subtração de P. exc. Acum. (passo atual) e P. exc. Acum. (passo anterior), mostra a Figura 15. Na primeira linha, a subtração foi zero, pois não havia nenhum valor anterior de precipitação excedente acumulada.

Figura 15 – Cálculos do Hietorgrama excedente.

O mesmo raciocínio anterior foi seguido em ∆Perdas (mm), a partir da coluna de Perdas (Figura 16).

Figura 16 – Cálculos de ∆Perdas.

Gráficos da Chuva Efetiva pelo Método SCS

Os gráficos a seguir foram gerados conforme a Precipitação Total, Hietograma Excedente e ∆Perdas (Chuva Efetiva – SCS), respectivamente, Figura 17, Figura 18 e Figura 19.

Figura 17 – Precipitação Total (mm).

Figura 18 – Hietograma Excedente (mm).

Figura 19 – Chuva Efetiva – SCS (mm).

REFERÊNCIAS

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS – ABNT. NBR NM 17054 – Agregados – Determinação da composição granulométrica – Método de ensaio. Rio de Janeiro: 2022.

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS – ABNT. NBR NM 248 -Agregados – Determinação da composição da granulometria. Rio de Janeiro: 2003.

DEPARTAMENTO DE ÁGUAS E ENERGIA – DAEE. Banco de Dados Hidrológicos. São Paulo, 2010. Disponível em: http://www.hidrologia.daee.sp.gov.br/. Acesso em: 13 fev. 2023.

ROLIM, Adriano. Apostila Hidrologia Aplicada. Porto Alegre: Universidade estadual do Rio Grande do Sul, 2004. Disponível em: https://docplayer.com.br/7811117-Hidrologia-aplicada-adriano-rolim-da-paz-texto-basico.html. .

UNITED STATES DEPARTMENT OF AGRICULTURE – USDA. Urban Hydrology for Small Watersheds. Technical Release 55. [S. l.]: Natural Resources Conservation Service, 1986.

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