Como calcular a perda de solo pelo Método de RUSLE?

Introdução

Existem diversas formas do solo sofrer erosão, por meio de fatores externos ambientais, como a ação da água da chuva e do vento. Um método vastamente aplicado para a determinação da perda média de solo pela erosão é o Método de RUSLE (FOSTER; JOHNSON; MOLDENHAUER, 1982; RIGHETO, 1998), originado pela revisão do Método de USLE.

O Método de RUSLE não se aplica em casos de erosão em córregos ou seção de um corpo hídrico. A aplicabilidade deste método é indicada para áreas de campos abertos com erosão laminar, ou seja, uma pequena lâmina de água da chuva que deslocou partículas de sedimentos do solo. Essa erosão poda ser intensificada pela ação antrópica, como em áreas (total ou parcialmente) descobertas de vegetação (Figura 1).

Figura 1 – Erosão laminar no solo. Fonte: Unesp (2005).

A erosão laminar pode ser originada pela atuação da água da chuva ou pelo vento. A erosão promovida pela precipitação gera uma ação denominada de efeito Splash. Partículas de sólidos são dispersadas com o impacto gerado pela energia cinética de gotículas de água da chuva, como mostra a Figura 2.

Figura 2- Efeito Splash no solo causado pela precipitação. Fonte: RESEARCH GATE (2018)

Algumas particularidades do método devem ser citadas. O Método de RUSLE deve ser utilizado em pequenas áreas de até 2,56 Km2 e série histórica de pelo menos 20 anos de dados de precipitação. Além disso, assim como em outros métodos da hidrologia (como o Método SCS), a equação da perda de solo é bastante sensível as suas variáveis.

Desse modo, vale ressalvar que o método necessita de certos critérios, principalmente na determinação de suas variáveis para não haver o desencadeamento de erros ao longo das etapas de cálculos. Por isso, cada variável da Equação Universal da Perda de Solo – RUSLE (Equação 1) será detalhadamente descrita nos passos a seguir.  

Descrição das variáveis

A primeira variável a ser descrita é denominada de fator de erosividade (R), que representa o potencial de chuva que pode ocasionar um processo de erosão no solo (TOMAZ, 2013). Depende da relação de perda de solo e da energia cinética promovida pela chuva, representada pela variável EI.  Então, o fator R é dado pela Equação 2 e Equação 3 (WISCHMEIER; SMITH, 1978):

De modo sequencial, para a determinação do fator R devem ser seguir as seguintes etapas:

  1. Obtenção dos dados históricos de precipitação (no mínimo 20 anos);
  2. Determinação da precipitação média mensal (Pm);
  3. Determinação da precipitação da média anual (P);
  4. Determinação dos valores de EI. Para cada mês da série histórica, precisa calcular um valor de EI.
  5. Somatório de cada EI mensal para a obtenção do valor de R;

A segunda variável da equação é o fator erodibilidade (K), em que determina a taxa de perda de solo por unidade de Erosividade da chuva, em um cenário de rampa de 9% e extensão de 22 m (RIGHETTO, 1998).

Essa variável está relacionada com as propriedades do solo. Nesta etapa, faz necessário identificar o tipo de solo da área de estudo. Pesquisar, de acordo com a estrutura e composição, a classificação da textura do solo, se arenoso ou siltoso ou argiloso e demais variações. Esse estudo a respeito do solo deve ser criterioso e refinado, uma vez que a equação universal da perda de solo é sensível a cada fator.

Uma das formas que pode ser determinado o fator K é por valores catalogados de solo. A  Tabela 1 apresenta valores de K, em função da classificação do solo e da porcentagem de matéria orgânica contida no solo. Não se recomenda o uso dessa tabela para solos com mais de 4% de matéria orgânica (TOMAZ, 2013).

Tabela 1 – Fatores K de erodibilidade do solo (ton/MJ/ha)/(mm/h).
Fonte: WANIELISTA; YOUSEF (1978) apud MAYS (2001).

A terceira variável é o fator LS, relacionada com as condições topográficas da área de estudo. Esse fator utiliza dois parâmetros: declividade da encosta (%) e comprimento da rampa (m). A determinação de LS é dado pela Equação 4.

Algumas limitações são estabelecidas pelo método. A rampa deve ter comprimento entre 10 a 180 m e a declividade média da encosta precisa ser inferior a 35% (Figura 3). Condições fora dos intervalos citados, não há confiabilidade nos resultados e o Método de RUSLE não pode ser validado.

Figura 3 – Condições topográficas requeridas pela Método de RUSLE.

A quarta variável utilizada na equação de RUSLE é o fator C, relacionado com o tipo de cultivo do solo (ou prática de cultivo). Inicialmente, o método foi desenvolvido para áreas agrícolas onde haviam plantações, porém, o mesmo foi atualizado e estendido para outras modalidades de usos da terra.

A Tabela 2 apresenta os valores de C (adimensional) para diversos usos do solo. Observa-se que em áreas de vegetações preservadas, como de florestas virgens, C tende aos menores valores (0,001), indicando menor perda de solo. Por outro lado, o cenário aposto de Terras desnudas apresenta o maior valor de C (1,000), acarretando maior perda. Assim, os fatores da equação de RUSLE podem influenciar para menor ou maior perda de solo.

Tabela 2 – Fator C de prática de uso da terra. Fonte: TOMAZ (2013).

A última variável de RUSLE é o fator P, relacionada a práticas de conservação do solo. Essas práticas são aplicadas para reduzir ou minorar os processos erosivos no solo. Quando existem esses tipos de dispositivos, acaba contribuindo para a diminuição da perda do solo. A Tabela 3 apresenta os tipos de manejos de práticas de conservação, em relação a inclinação do terreno.

Tabela 3 – Fator P de práticas de conservação do solo. Fonte: RIGHETTO (1998) apudTOMAZ (2013).

Verifica-se que os valores de P variam de 0,10 a 1,0. Essas variações indicam o quanto cada prática conservativa pode impedir o arraste de solo, de modo que a prática que menos contribui para a contenção é o plantio morro baixo, (Figura 4 – A) e a mais favorável é o terraceamento (Figura 5 – D).

No plantio morro abaixo (Figura 4 – A), as gotículas de chuvas facilmente podem transportar partículas de sedimentos, pela ação da gravidade. Na prática de faixas niveladas (Figura 4 – B), à medida que a inclinação é menor os valores de P são reduzidos (menor transporte de solo). Nos cordões de vegetação permanente (Figura 4 – C), as espécies vegetais plantadas entre os cultivos agrícolas promovem a contenção do solo.

Figura 4 – Práticas de manejo de conservação solo; A – Plantio morro abaixo; B – Faixas niveladas; C – Cordões de vegetação permanente.

No terraceamento (Figura 5), são realizados cortes no solo (A) e logo a frente, depositado esse solo (B), com o objetivo de formar uma barreira física contra a ação da água da chuva. A contenção da água da chuva pelo terraceamento pode ser vista na Figura 5 – D.

Figura 5 – Representação esquemática de Terraceamento em perfil. A – Faixa de movimentação de terra; B – Dique; C – Canal; D – Imagem de terraceamento após precipitação.  

Exemplo prático 

A aplicação prática, para o Método da equação universal da perda de solo – RUSLE, foi em uma pequena propriedade agrícola localizada no estado de Minas Gerais, no município de Monte Santo de Minas (Figura 6), nas coordenadas 21°8’48.93″S; 47° 0’24.11″O, de acordo com o Google Earth. As etapas de aquisição de dados, pré-tratamento, cálculos dos fatores e da perda de solo foram detalhadas nos tópicos a seguir.

Figura 6 – Localização da área de estudo em Monte Santo de Minas – MG. Fonte: GOOGLE LLC (2022).

Aquisição de dados

Pelo site do Hidroweb, foi feita a delimitação da área de estudo e localizada uma estação pluviométrica mais próxima, para a aquisição dos dados de precipitação (Figura 7).

Figura 7 – Estação pluviométrica. Fonte: ANA (2019).

A área de estudo foi delimitada por meio da ferramenta Medição disponibilizada pelo Hidroweb, como mostra  Figura 8. Foi obtida uma área de 2,77 hectares.

Figura 8 – Delimitação e medição da área de estudo. Fonte: ANA (2019).

Os dados da estação pluviométrica foram baixados em Séries Históricas, do Hidroweb, como mostra a Figura 9. Os arquivos podem ser baixados em três tipos de formatos: .mdb, .txt ou .csv.

Figura 9 – Download dos dados de precipitação da estação Fazenda Carvalhais. Fonte: ANA (2019).

Caso os dados sejam baixados em Arquivo Texto (.txt), podem ser facilmente organizados pelo software Super Manejo da Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS. Se forem baixados em Arquivo Excel (.csv) podem ser diretamente utilizados, como mostra a Figura 10.

Figura 10 – Dados de precipitação baixados em .csv.

Pré-tratamento dos dados

Os dados pluviométricos obtidos foram tratados e organizados, como mostra a Figura 11, em uma planilha. O período compreendido foi de 1983 a 2020, com precipitações diárias.

Figura 11 – Dados pluviométricos.

Os dados para a preparação dos cálculos do fator R (ou fator de erosividade) foram organizados, como mostra a Figura 12. Foram dispostos deste modo, para calcular as médias de chuva mensais (Pm) entre os anos de 1983 a 2020.

Figura 12 – Cálculo do fator R de erosividade. 

Como aplicar na prática a equação de RUSLE?

Na planilha de cálculos, foi reservada uma aba para a obtenção das variáveis da equação da perda de solo – RUSLE (Figura 13).

Figura 13 – Planilha para os cálculos dos fatores.

A determinação do fator R (Figura 14), inicia-se pelo cálculo das médias mensais de chuva (Pm), passo 1. Essas médias foram calculadas na aba “Fator R” da planilha (Figura 11), como citado anteriormente. O passo 2 foi a média anual (P) que é obtida pela soma de todas Pm do passo 1. O passo 3 foi dado pelo cálculo de cada Energia mensal (EI) que depende da precipitação média e precipitação anual.  Em seguida (passo 4), pela soma de todos os EI (obtidos anteriormente no passo 3). Esse somatório final correspondo ao valor de R que foi igual a 8084,523 (MJ/ha) / (mm/h). O resultado de R foi próximo aos valores típicos obtidos para a sua localização (Minas Gerais), de aproximadamente 6.000,00 a 8.000,00, de acordo com o gráfico presente na Figura 14.

Figura 14 – Determinação do fator R.

Os valores do fator K de erodibilidade foram inseridos e catalogados na planilha, em função do tipo de solo (1) e porcentagem de matéria orgânica (2), conforme a Tabela 1. Para mudar o tipo de fator, basta alterar as opções mostradas na Figura 15. O fator de K foi igual a 0,03 (ton/MJ/ha) / (mm/h), conforme as especificações de solo arenoso (1) e matéria orgânica de 4% (2).

Figura 15 – Determinação do fator K.

A determinação do fator LS de declividade foi por meio da inclinação S e do comprimento da rampa Lx. Para isso, foi necessário consultar as cotas máxima e mínima (respectivamente Cota 1 e Cota 2) e medir o comprimento da rampa (Figura 16).

Figura 16 – Determinação do fator LS.

Pelo Google Earth, foram obtidas as cotas pelas ferramentas disponibilizadas pelo software (Figura 17). Vale ressaltar que a utilização do Google Earth foi meramente por questões didáticas. Em projetos profissionais, emprega-se o estudo da topografia do local ou o Modelo Digital de Elevação (MDE) em alta resolução.

Primeiramente, foi traçada uma reta no centro da rampa e pela opção Mostrar perfil de elevação , as cotas foram obtidas (Figura 17). A partir dos valores das cotas foi calculada a declividade S (6,3636%). A reta traçada na rampa apresentou medida de Lx = 110 m.  Assim, foi possível obter o fator LS por meio do dado de Lx e o valor calculado de S. O fator LS foi de 1,68828.

Figura 17 – Determinação das cotas pelo Google Earth. Fonte: GOOGLE EARTH (2022).

As determinações do fator C de práticas de cultura e fator P de práticas de conservação ocorreram, como mostra a  Figura 18. Ambas as práticas foram catalogadas na planilha, na aba de Banco de Dados. Como a área de estudo é usada somente para cultivo, foi selecionada a opção de Plantações no fator C. A opção de Plantações foi selecionada no fator P, pois não havia prática de conservação e apenas plantações agrícolas.

Figura 18 – Determinação do fator C e fator P.

Por fim, a última etapa foi a determinação da perda anual de solo.  O Valor de A foi igual 16.37874 ton/ha/ano, como mostra Figura 19. Para obter a perda de solo em função da área, foi multiplicada a perda anual A pela área de estudo (2,67 ha), obtendo-se um nova perda de solo igual a A = 43.73123 ton/ano.

Figura 19 – Determinação da perda de solo anual – RUSLE.

Cabe ressaltar que existem diversos valores de K, C e P catalogados na literatura, mas para o exemplo prático foram usadas as tabelas da Figura 20. Outras poderiam ser aplicadas, conforme a necessidade e a critério de cada profissional. Para fins didáticos, os valores marcados de verde promovem menor perda do solo; os valores em amarelo uma perda um pouco maior do que os grifados de verde; os laranjas causam uma perda intermediária e o os fatores grifados em vermelho, geram a maior perda de solo.

Figura 20 – Tabela dos fatores de K, C e P.

Resumo das variáveis

O Quadro 1 apresenta de modo resumido todas as variáveis da equação de perda de solo – RUSLE.

Quadro 1 – Resumo das variáveis da Equação Universal de Perda de Solo – RUSLE.

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REFERÊNCIAS

AGÊNCIA NACIONA DE ÀGUAS. Hidroweb v3.2.7. Brasília, 2019. Disponível em: https://www.snirh.gov.br/hidroweb/mapa. Acesso em: 2 jan. 2023.

FOSTER, G.R.; JOHNSON, C.B.; MOLDENHAUER, W.C. Critical slope lengths for unanchored comstalk and wheat straw residue. Transactions of the ASAE, v. 25, p. 935–939, 1982.

GOOGLE LLC. Google Earth Pro. Versão 7.3.6.9345 (64-bit). California: Gloogle, 2022.  

MAYS, LARRY W. Water Resources Engineering. 1. ed. New York: John Wiley & Sons, 2001.

RESEARCH GATE. Efeito splash provocando o início do processo erosivo nas encostas. 2018. Disponível em: https://www.researchgate.net/figure/Figura-1-Efeito-splash-provocando-o-inicio-do-processo-erosivo-nas-encostas_fig1_328436756. Acesso em: 28 fev. 2023.

RIGHETTO, ANTONIO MAROZZI. Hidrologia e Recursos Hídricos. 1. ed. São Carlos: USP, 1998.

TOMAZ, Plínio. Capitulo 23- RUSLE- Equação revisada universal de perda de solo. In: CURSO DE MANEJO DE ÁGUAS PLUVIAIS. São Paulo, 2013. p. 17.

UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUISTA FILHO” – UNESP. Módulo 3 – Interação Homem-Ambiente – 3. Geodinâmica Externa. São Paulo, 2005.

WANIELISTA, Martin P.; YOUSEF, Yousef A. Stormwater Management. New York: John Wiley & Sons, 1978.

WISCHMEIER, W. H.; SMITH, D. D. Rainfall energy and its relationships to soil loss. Washington: Transactions of the American Geophysical Union, 1978.

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